Olhava as relações como quem vê objectos por detrás de uma montra. Como se não fizesse parte delas, vendo-as de fora, gravitando por cima, silenciosa e laconicamente. Saía disposta a fazer gastos, entusiasmada com as novidades, as novas colecções, as modas da estação. Via, primeiro de longe, e depois de mais perto, já inclinada como quem espreita através do vidro, chegava a convencer-se de que esta ou aquela peça tinham sido talhadas para si, como fatos de alfaiate. Decidia-se e, num impulso consumista, arriscava tudo e abria a porta. Experimentava. A cor era perfeita, no manequim os contornos ficavam irrepreensivelmente marcados. Por não ser capaz de comprar sem experimentar, pedia o seu tamanho (o mesmo há anos salvo pequeninas oscilações) e dirigia-se ao provador. Antecipava os sacrifícios que teria de fazer pelo inesperado capricho, as contas complicadas para suportar aquele gasto tão fora dos planos. Mergulhava naquele mar de tecido, emergia e olhava-se ao espelho. Como de todas as outras vezes: grande demais, pequeno demais, justo demais, largo demais, com muita cor, sem cor nenhuma, demasiado áspero o tecido, demasiado dengoso o toque, comprido demais, excessivamente curto, desconfortável, insuficientemente formal. Saía, invariavelmente, de mãos vazias para percorrer uma enorme avenida de sensibilidades e regressar a casa como de costume: sem nada de novo. Percebeu que, nas emoções, como nas vestes, não valia a pena investir senão na alta costura, na qualidade dos materiais, no corte feito rente ao corpo por mãos experimentadas e capazes. Tornou-se, a partir desse momento, uma
windowshopper emocional. Tudo porque nunca ninguém lhe ensinou como comprar nos saldos.
Posted by Ithaki | 5:05 da tarde
Posted by A. | 12:28 da manhã
Posted by Tiago Machado da Graça | 4:25 da tarde
Tiago, já tinha dado por isso quando passei pelos Incontinentes. Seja bem-vindo ao Mel.
Posted by LAC | 5:24 da tarde
Posted by A. | 3:51 da manhã