Dos clássicos
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Imaginem o que é passar os dias como se fossem um taxista Argentino recém-chegado à Bélgica. Que nunca tiveram uma aula de Francês (ou Flamengo). Que passam os dias a divagar por caminhos desconhecidos, entre o sinuoso e o monocromático. Que, recorrentemente, dão por vós a fazer um esforço entre inútil e o propositada e orgulhosamente desajeitado para se fazerem perceber e para descortinar o que os outros vos queiram transmitir. Tudo isto, com raras excepções, resulta, amiúde, em desencontros, gafes, mal entendidos, surdez crónica e um alheamento desinteressado em relação ao um mundo que insiste em continuar sem nós. E agora imaginem a alegria confortada e estarrecida de ver entrar nesse táxi ordeiro e burocrático alguém que não só fala o mesmo dialecto espanhol que se ouvia na nossa distante aldeia natal mas que, além de tudo, conhece os nossos caminhos.
Ao que acontece, neste momento que descrevi, chama-se reconhecimento. A isto, amadurecido pelo respeito e admiração mútuas e temperado com uma cumplicidade cruel e uma sinceridade provocadora, chama-se amizade. Porque, aos 75 anos, é uma maçada até que se encontre alguém com quem se queira partilhar a mesma frisa para assistir ao passar dos dias. Obrigada.
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