Sucedâneos
Digamos que, quem consome ou se contenta com sucedâneos sofre, na minha humilde opinião, da síndrome do "To settle for less", que, confesso, ao longo destes 26 anos, me tem causado bastante aflição.
Vamos a exemplos práticos: Quando se gosta mesmo de manteiga, a ideia do pão ou torradas barrados em margarina não pode senão causar profunda náusea. O mesmo se diga quando se gosta (como eu) de chá preto Darjeeling e nos aparecem com a saqueta do chá preto ranhoso de proveniência não identificada.
Se o sucedâneo é a substância que pode substituir outra, então, logicamente, cabe a quem consome decidir o que é sucedâneo de quê, o que, necessariamente terá uma evolução de crescimento no sentido oposto ao do grau de exigência.
Ora, quem encontra muitos sucedâneos, satisfaz-se com coisas relativamente diferentes das que inicialmente procurava (porque não as encontrou ou não quis dar-se ao trabalho de procurar). Em bom rigor, quem aceita os sucedâneos padece — ou virá a padecer— da síndrome do "To settle for less".
"To settle for less", ou, em português “contentar-se com o menos” é, quanto a mim, uma praga pior que o gafanhoto ou as formigas que atacam todo o Campo de Ourique ao primeiro sinal de primavera. É a velha teoria do “não tens média para entrar na faculdade de medicina vai para a de dentária(..)!” que nos tem oferecido, nas últimas décadas, muitos dentistas com verdadeiro horror à boca do próximo e que explica o pânico generalizado a esta classe que atravessa tantas gerações.
Não consigo, e se calhar por isso não sou tão feliz como acho que mereço, aderir a sucedâneos, nem contentar-me com o menos.
Se me apetece que a casa cheire a pinho, não compro Ajax de lavanda só porque o outro esgotou naquele supermercado. Percorro mais um quarteirão até encontrar o que realmente quero. Se me apetece ouvir a Elis Regina, é escusado tentarem impingir-me a Maria Rita, que é filha da outra senhora e tudo, e até nem canta mal, mas não é a mesma coisa.
O problema — porque aquilo que vos relatei antes não é um verdadeiro problema para quem não atinja o meu grau de neurose (há de haver quem — e Bem! — se esteja borrifando para o detergente de pinho) — dos dias que correm, é que, também nas relações pessoais, as pessoas consomem sucedâneos, contentam-se com o menos e, cada vez mais, barram a alma com margarina e limpam as memórias com detergente de lavanda.
Posted by Planeta a cores | 7:21 da tarde
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