Sempre invejei aqueles que, abençoados pela vigília originária, nunca apreciaram os prazeres ou a dependência do sono. Os que ostentavam triunfalmente as 4 horas passadas no leito como suficientes para retemperar e recuperar o corpo e a mente. Certamente com código genético herdado de koalas nunca fui capaz de dedicar-me a raciocínios intrincados sem desrutar de, pelos menos, 7 horas de sono; de ser socialmente aprazível com menos de 8; ou de demonstrar algum sentimento nobre pelo próximo com menos de 10 horas de pálpebras cerradas. As longas noites de estudo na faculdade e o ritmo de trabalho alucinante vieram, a injecções de adrenalina, aumentar o leque de possibilidades e a resistência, sempre por absoluta noção de dever e frenesim profissional. Noites perdidas em negociações, redacção e análise de contratos deixaram há muito de ser raras; mas sempre lutando por não me deixar aninhar nos braços de Morfeu, com doses de teína que certamente ultrapassariam todas as escalas conhecidas nos testes de dopping.
Recentemente, uma nova experiência: as insónias. Não ao deitar (como no comum dos mortais) mas umas horas antes do amanhecer. Pelas 5 da manhã, a tempo de ver nascer o sol que me sorri cinicamente indagando da beleza do seu reles e apreciado umbigo. Invariavelmente, há algumas semanas, o crepitar dos móveis, o acordar das ruas, a tosse da vizinha do segundo andar que é hospedeira e sai para fazer o primeiro voo da manhã para Madrid às 7. E eu, entre a angústia e a desesperança, folheio livros, adianto trabalho, rebolo-me decadentemente na cama, espreito o sol que, infame, insiste em fazer-se nascer, até que o sono — atrasado e trôpego como um marido boémio — entre em casa, pé ante pé, e me envolva nos seus braços (o topete...) meia hora antes de tocar o despertador.