Mel Com Cicuta 

Without the aid of prejudice and custom I should not be able to find my way across the room.

 

William Hazlitt  
      

   

segunda-feira, abril 30, 2007

Gosto mesmo deste blogue.

Chamem-me submissa.
Adoro quando alguém que eu não posso tratar por tu me trata por tu.
Eu, por acaso, acho infinitamente mais graça quando alguém que pode tratar-me por tu insiste em não o fazer. (Mas tem de poder mesmo).

Porque hoje é como se fosse Sexta-feira



Para a rapaziada do Corta-fitas, em jeito de momento pré-tertúlia literária.

Para colar na porta do frigorífico

Ou: Como não tinham mais nada para oferecer um ao outro mas, no fim de contas, no amor e na guerra, o importante é que se tenha aprendido a ler pela mesma cartilha.

Caso prático

Se A tenta convencer B de que este último é má pessoa, apoiando-se unicamente no critério de B sentir recorrentemente necessidade de verbalizar as coisas que os outros seres humanos sentem mas não são capazes (ou simplesmente não querem) dizer, não deverá B — em vez de recorrer à terapia ou de passar o dia seguinte escondido debaixo de uma manta no sofá em depressão profunda — tentar explicar a A que aquilo que está a definir como elemento constitutivo de uma grave falha de carácter é apenas uma manifestação de ausência de hipocrisia? Ou, posto de maneira mais acessível a mentes menos elaboradas, dizer-lhe, com um sorriso terno e olhar profundamente sincero: “E se fosses ver se chove?”.

O mundo era muito pior sem coisas como esta


[Cantaloupe Island - Herbie Hancock, Wayne Shorter, Dave Holland, Brian Blade Live at the Vienne jazz festival 2004]

sábado, abril 28, 2007

Como um espelho

Reflectia com fidelidade tudo o que lhe era mostrado sem mostrar nada do que estivesse do lado de dentro. Para trazer 7 anos de má sorte bastava que a tentassem fazer em cacos.



[Retrato em branco e preto - Chet Baker & Nicola Stilo]

Porque há dias em que somos a preto e branco.



E isto, meus amigos, é Djaying de qualidade. Upa-upa. Com os devidos agradecimentos.

sexta-feira, abril 27, 2007

o suburbano emocional

Nascido numa família tradicional abastada pôde conhecer o mundo e cultivar-se. Leu os clássicos, abraçou outras culturas, fez-se melómano, homem de horizontes largos. Tristemente, em matéria de sentimentos, nunca saíu de Tercena.

Caminhos para a elevação

[In the Mood, Glenn Miller& his Orchestra]

Isto sim, tirava-me de casa num Sábado à noite.

quinta-feira, abril 26, 2007

Para jovens que não vivam em casa dos pais




Chutar cachorro morto

Já uma vez escrevi aqui sobre uma expressão brasileira que muito aprecio: "chutar cachorro morto", usada para descrever situações em que o agente recorra a uma prática violenta e desnecessária tendo em conta a inferioridade/debilidade da outra parte que está, naquelas especiais circunstâncias, incapaz de retaliar. A ideia é acentuar a desnecessidade e astenia daquela reacção que não produzirá um efeito prático relevante sobre uma contraparte vencida à partida.
Neste blogue respeitamos o descanso dos finados. Nada do que aqui é escrito deve ser lido como uma mensagem, recado, desafio, juízo ou crítica incidindo sobre bocados da Criação com quem nos tenhamos cruzado de facto (salvo excepções devidamente assinaladas). Ainda que recorrendo ao discurso directo, nesta casa, o mote é o do exercício literário da representação figurativa. Parte-se do concreto para o abstracto, da experiência para a generalização.
Quando os assuntos estão vivos, temos a decência e o decoro de não escrever sobre eles e quando estão mortos o respeito de os deixar descansar em paz.

Lobotomia do Séc. XXI

Esvaziar a caixa dos e-mails, o arquivo do Word, a pasta "os meus ficheiros recebidos", apagar os contactos de Messenger, os SMS (recebidos, gravados, enviados e multimédia), os contactos do e-mail, telemóvel e agenda electrónica. Retirar o Blogue dos favoritos, apagar do I-pod os ficheiros das músicas que ouvíamos juntos. E assim tirar-te da minha vida.

quarta-feira, abril 25, 2007

Lonely planet guide for twisted minds



[Mysterious Ways, U2]

No dia seguinte, quando olhou o lugar vazio à sua direita na cama, percebeu que ele tinha dormido com ela, não para possuir o seu corpo, mas para tentar furtar tudo o que ela tivesse dentro da cabeça .

Mesmo que não tenha chegado a casar



Um cânone sagrado. Para conservadores, liberais, católicos, ateus, cépticos, agnósticos e até bloquistas.

terça-feira, abril 24, 2007

Upside down





Ora bem: imaginem que vivem sozinhos, sem partilhar o vosso espaço com qualquer ser vivo além de uma orquídea japonesa moribunda e agonizante. Que estão habituados a todos os sons e movimentos da vossa casa.

Numa bela manhã, pouco depois de tocar o despertador, às 9, descem à entrada do prédio para ir ao correio e deixam a porta de casa entreaberta por preguiça de usar a chave. Voltam a casa, arrastam-se até ao frigorífico rosnando impropérios (por ser manhã) e ficam ali, inertes, durante aqueles segundos necessários para focar os rótulos dos iogurtes e pacotes de leite. Do nada, sentem um ser vivo roçar-se nos vossos tornozelos descalços. O Jeremias, que é o gato da minha vizinha de cima, achou que hoje devia vir tomar pequeno-almoço lá a casa. Para acabar o post em beleza, devia colorir a imagem ternurenta e rematar dizendo que lhe dei um pires de leite. Como é óbvio, uma vez recuperada do enfarte do miocárdio e visivelmente agravadas as já pouco estáveis condições atmosféricas matinais, o Jeremias foi corrido à vassourada para aprender a ir roçar-se nos tornozelos da velha do terceiro esquerdo que tem muito mais ar de gostar de companhia pela manhã do que eu.
Seja como for, por ter virado a casa do avesso, o Jeremias tem direito a banda sonora. É só clicar.

segunda-feira, abril 23, 2007

La Faute de l'Abbé Mouret

Este post acolheria a estranha combinação da palavra "plágio" com a expressão "conversa de almofada". É melhor ficarmos pela publicação da banda sonora. Em Francês.



[Placebo, Protect me from what I want (Protége-Moi)]

Porque hoje acordei, vá, um bocadinho maçada.



[Superafim, Cansei de Ser Sexy]

domingo, abril 22, 2007

Renascimento



Depois de ver nascer o sol ao pé do rio e de tomar o primeiro banho nas águas geladas do Guincho, este fim de tarde morno e ledo. Ithaki, eu prefiro esta versão. Mas temos até Outubro para discutir estes pormenores.

Conservadores

Porque sabem distinguir intimidade de invasão da propriedade privada.

sexta-feira, abril 20, 2007

'Cause it takes one to know one



Enviado, à medida, por alguém que o foi roubar ao Sítio (no ponto).

Da rectidão

L’aplomb dépend des milieux où il se pose : on ne parle pas à l’entresol comme au quatrième étage, et la femme riche semble avoir autour d’elle, pour garder sa vertu, tous ses billets de banque, comme une cuirasse dans la doublure de son corset.

[Gustave Flaubert, Madame Bovary]

Cânon



Porque, ultimamente, se tem ouvido pouco jazz nesta casa e isso começava a deixar-me claustrofóbica: nada como os clássicos.

quinta-feira, abril 19, 2007

Entretanto, na nossa outra casa

Pela primeira vez em Portugal um blog é credenciado como um media tradicional para a cobertura de um evento político. Os new media já chegaram, e enviam pessoas com três nomes para o espaço. Um monárquico e uma social-democrata encontram-se para os cocktails e seguem para o largo do Caldas. Sem censuras e amiguismos à parte, sigam esta espécie de Bonnie & Clyde da Blogosfera e divirtam-se tanto quanto nós. Ali, ao minuto, no Sábado.


Conservadores

Porque, depois, não é nada. É como se não fosse coisa nenhuma. Mesmo que não tenha sido.

São camélias, senhor. São camélias. (2)

Ce fut moins par vanité que dans le seul but de lui complaire. Il ne discutait pas ses idées ; il acceptait tous ces goûts ; il devenait sa maîtresse plutôt qu’elle n´était la sienne. Elle avait des paroles tendres avec des baisers qui lui emportait l’âme. Où avait-elle appris cette corruption, presque immatérielle à force d’être profonde et dissimulée ?

[Gustave Flaubert, Madame Bovary]

quarta-feira, abril 18, 2007
















Mais do que uma alegoria, um vício para os próximos tempos. No I-Pod e também ali, na Jukebox mental: These Things, She Wants Revenge.

Windowshopper emocional

Olhava as relações como quem vê objectos por detrás de uma montra. Como se não fizesse parte delas, vendo-as de fora, gravitando por cima, silenciosa e laconicamente. Saía disposta a fazer gastos, entusiasmada com as novidades, as novas colecções, as modas da estação. Via, primeiro de longe, e depois de mais perto, já inclinada como quem espreita através do vidro, chegava a convencer-se de que esta ou aquela peça tinham sido talhadas para si, como fatos de alfaiate. Decidia-se e, num impulso consumista, arriscava tudo e abria a porta. Experimentava. A cor era perfeita, no manequim os contornos ficavam irrepreensivelmente marcados. Por não ser capaz de comprar sem experimentar, pedia o seu tamanho (o mesmo há anos salvo pequeninas oscilações) e dirigia-se ao provador. Antecipava os sacrifícios que teria de fazer pelo inesperado capricho, as contas complicadas para suportar aquele gasto tão fora dos planos. Mergulhava naquele mar de tecido, emergia e olhava-se ao espelho. Como de todas as outras vezes: grande demais, pequeno demais, justo demais, largo demais, com muita cor, sem cor nenhuma, demasiado áspero o tecido, demasiado dengoso o toque, comprido demais, excessivamente curto, desconfortável, insuficientemente formal. Saía, invariavelmente, de mãos vazias para percorrer uma enorme avenida de sensibilidades e regressar a casa como de costume: sem nada de novo. Percebeu que, nas emoções, como nas vestes, não valia a pena investir senão na alta costura, na qualidade dos materiais, no corte feito rente ao corpo por mãos experimentadas e capazes. Tornou-se, a partir desse momento, uma windowshopper emocional. Tudo porque nunca ninguém lhe ensinou como comprar nos saldos.



Lendo um dos meus blogues preferidos, a Pastoral Portuguesa, descubro que o autor tem, no que às referências hitchcockianas diz respeito, o mesmo padrão hierárquico que eu. Assim sendo, de castigo por escrever coisas tão boas de ler, vai direitinho para a Cicuta aqui ao lado.

terça-feira, abril 17, 2007

Un froid horrible

Cependant les flammes s’apaisèrent, soit que la provision d’elle-même s'épuisât, ou que l’entassement fût trop considérable. L’amour, peu à peu, s’éteignit par l’absence, le regret s’étouffla sous l’habitude ; et cette lueur d’incendie qui empourprait son ciel pâle se couvrit de plus d’ombre et s’effaça par degrés. Dans l’assoupissement de sa conscience, elle prit même les répugnances du mari pour des aspirations vers l'amant, les brûlures de la haine pour des réchauffements de la tendresse ; mais, comme l’ouragan soufflait toujours, et que la passion se consuma jusqu’aux cendres, et qu’aucun secours ne vint, qu’aucun soleil ne parut, il fut de tous côtés nuit complète, et elle demeura perdue dans un froid horrible que la traversait.

[Gustave Flaubert, Madame Bovary]

Thank you all





Agradecimentos sinceros e algo embaraçados: ao Henrique Burnay que me mostra todos os dias que vale a pena deixar algumas portas abertas, ao Paulo Pinto Mascarenhas sempre exagerado no elogio, ao Nuno Miguel Guedes, delicioso parceiro no crime, à Ithaki por tanta coisa partilhada, ao sempre cortês Pedro Correia, ao Henrique Raposo por se ter lembrado, ao Kare Sansui pela fidelidade com que nos segue, à recém-descoberta Margot, ao António Amaral por ser um exemplo de boa vizinhança, a todos os que escreveram e-mails, passaram pela caixa de comentários e, de uma ou de outra maneira, vão passando por esta casa que é, apesar do despotismo instalado, também um pouco vossa. Obrigada. A emissão prossegue com uma das músicas mais esperançadas deste início de primavera. Basta clicar.

segunda-feira, abril 16, 2007

Travelling



[Love is a Place, Metric]

Pois é, e já lá estivemos todos. Se não se importam, desta vez seguimos para Nova Iorque, sim?

Da intimidade

Mais do que as chaves de casa, deu-lhe a password do blogger.

domingo, abril 15, 2007

Time goes by



O Mel faz hoje dois anos (a cicuta, acho que esteve comigo a vida inteira). Seja como for, 805 posts depois, percebi aquilo que ingenuamente nunca coloquei como hipótese: que este blogue me mudaria muito mais do que eu a ele.
Desde Abril de 2005, para além da sabedoria de uma anciã de 27 anos, a pertença a esta espécie de comunidade chamada blogosfera, primeiro apenas nesta casa e, depois, numa espécie de condomínio partilhado como o 31 da Armada, mudou algumas coisas e sedimentou muitas outras. Entraram, por esta porta, na minha vida, pessoas extraordinárias como M, L, G ou S, foram confirmadas e sedimentadas cumplicidades com amigos já próximos como H, P ou I, aprendi a ler gente de quem não gostava, a gostar de gente que nunca tinha lido, a gostar de gente que gostava de ler mas de quem não gostava de gostar. Conheci homens e mulheres inteligentes, leais, com os encantadores defeitos dos seres humanos decentes. Cruzei-me com idiotas, patetas e humanidade absolutamente dispensável, mulheres enfadonhas com o síndrome da princesa fechada na torre (que deviam estar fechadas na cozinha) e engatatões de porta de tasco (um pouco mais refinados, mas pouca coisa). Vi lançados boatos sobre mim, ouvi boatos e crueldades gratuitas sobre os meus amigos, vi a maldade e a estupidez personificadas na inveja de quem nunca será capaz de fazer da escrita mais do que um encadear tosco de palavras estridentes.
Percebi, enfim, que esta coisa dos blogues é apenas como São Martinho do Porto ou o meu Porto Santo: um lugar para onde ocasionalmente migra um determinado número de pessoas que vão estabelecendo relações entre elas nas quais se reflecte o melhor e o pior que cada um de nós tenha para dar.
E, meus amigos, ao fim de dois anos, o meu saldo é francamente positivo. Obrigada pela companhia.

sábado, abril 14, 2007

Mais do que a agressão recíproca, a sinalagmática: a que nao opera necessariamente por retribuição na mesma moeda, mas sim pelo critério do merecimento do outro.

Momento Nike woman

Fim de tarde, nada de jeito para fazer, jornais do dia já lidos. Finalmente coragem para abandonar o sofá e ir fazer alguma coisa pela vidinha: fato de treino (de efeito estético irrepreensível), ténis de corrida e o fiel I-pod que contém já uma selecção musical para o efeito que nunca chegou a ser experimentada. Sair de casa, descer à Estrela, entrar no jardim, correr absorvida na batida de um house que só se suporta para forçar o corpo a manter o ritmo. 10 minutos: um grupo de rapazes fuma erva, é preciso evitar passar por ali quando as vias respiratórias estejam, como é o caso, mais sequiosas e desobstruídas. 20 minutos: a inércia reiterada venceu as boas intenções. Amanhã há mais. Se o espírito de iniciativa vencer a preguiça despoticamente instalada.

sexta-feira, abril 13, 2007

Gostar de Cicuta

Através da amorosa Luna cheguei a este extraordinário post. Fica o teaser, mas ide lá ver.

Janelas de oportunidade



Para a Ithaki, uma antevisão do nosso Outubro próximo. Até já.

Planos para o fim de semana (da privação para o idílio)




Manual de instruções para a rapaziada

Quando uma mulher está a discutir convosco, coisas sérias ou banais, à mesa das negociações ou em contexto muitíssimo pessoal, se a conversa se tornar dura e crispada, em hipótese alguma (repitam todos comigo: hipótese a-l-g-u-m-a) deverão desviar o assunto e comentar como ela está (ou é) bonita e/ ou como o novo penteado lhe fica a matar. Mesmo que seja verdade. O elogio pode, em vez de um fiel aliado, transformar-se num perigoso alçapão quando combinado com a inépcia negocial de alguns homens.

Entretanto, na mesa ao lado

[Ela] - Estás proibido de mexer lá em casa.
[Ele] - (...)
[Ela] - O Sofá não é teu.
[Ele] - (...)
[Ela] - A casa não é tua.
[Ele] - (...).

quarta-feira, abril 11, 2007

São camélias, senhor. São camélias.

Il obéit donc, mais la hardiesse de son désir protesta contre la servilité de sa conduite, et, par une sorte d’hypocrisie naïve, il estima que cette défense de la voir était pour lui comme un droit de l’aimer.

[Gustave Flaubert, Madame Bovary]

Coisas que podem animar uma miúda acometida pela privação do sono



[Arcade Fire e David Bowie, Wake Up]

Coisas que podem animar uma miúda que trabalha a desoras



[U2 e Arcade Fire num cover de Love Will Tear Us Apart Again dos Joy Division em Montreal, Novembro de 2005.]

terça-feira, abril 10, 2007

Métodos proibidos de prova (proposta de lei)

1. São nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas.
2. São consideradas ofensivas da integridade física ou moral das pessoas as provas obtidas, mesmo que com o consentimento delas, na cama, no sofá, na mesa do restaurante, da sala de jantar, na cadeira da sala, no banco do jardim e, bem assim, em qualquer circunstancia, desde que o indivíduo se encontre fisicamente próximo daquele com quem tenha, à data da produção da prova, um qualquer relacionamento do qual resulte um aumento da produção de dopamina no cérebro.

Ever been in love with a gangster? (2)

A resposta certa (para colar na porta do frigorífico). Aqui.

segunda-feira, abril 09, 2007

Ever been in love with a gangster?




[You make me feel so young, Frank Sinatra]

Páscoa

A casa dos pais; a harmonia morna da casa dos pais; o frigorífico cheio de coisas insultuosamente calóricas da casa dos pais; o sofá da casa dos pais; os canais Fox e Fox Live (na nossa casa, mas, desta vez, na casa dos pais); a missa pascal; a casa das tias que cheira sempre a madeira muito bem encerada e a bolos acabados de fazer; as perguntas típicas dos almoços de casa das tias forçadas garganta abaixo com quantidades homéricas de tudo o que tivesse valor calórico proporcional à inadequação dessas perguntas; e, finalmente, um avião de regresso para casa. E o Dr. House à minha espera.

sexta-feira, abril 06, 2007

Para ler com banda sonora

Aquela mulher que, contrariando o seu instinto de protecção e a sua aprendizagem quanto aos níveis e territórios de segurança, se envolver com o crápula, não poderá culpá-lo dessa escolha. Não sendo o crápula um mestre na arte da dissimulação mas tão somente primoroso na distinta mestria da sedução, não cabe senão à mulher ser a guardiã da fortaleza da sua virtude. Se, ainda assim, e de olhos bem abertos, encarar de frente o desafiante, e aceitar entregar-se à lide, é-lhe exigida apenas a grandeza de se levantar, depois de cada rasteira, sem qualquer ruído e causando o menor incómodo aos que rodeiem ambos.



[Snow Patrol, Chasing cars, Grey's Anatomy]




quinta-feira, abril 05, 2007

Reflexão quaresmal

Deus nos dê a presença de espírito e a sagacidade necessárias para distinguir os que são apenas primários dos realmente primatas.

Sobre rapazes

quarta-feira, abril 04, 2007

Naquele momento, alheada pelo pungente contrabaixo e fixando o chão lustroso, lembrou-se que não gostava de rosas vermelhas.

terça-feira, abril 03, 2007

Chá preto bem forte



E isto aqui em cima, até fazer o chão tremer. (E sabem bem o que fazer com os bons dias melosos e enérgicos).

The Call (2)


[Librairie Shakespeare & Co, 37 Rue de la Bucherie, Paris]

The Call

[Mark Rothko, Black on Maroon 1959, Tate Modern]

segunda-feira, abril 02, 2007

Cartão-Postal (com destinatário)


[Bellagio - Lago di Como]

Posologia

Episódios recentes chamaram a minha atenção para uma nova geração de medicamentos. Começa a ser comum a prescrição de fármacos “de toma única”. Para quem, como eu, se perde constantemente no verdadeiro labirinto de anti-inflamatórios (de 6 em 6 horas), antibióticos (de 8 em 8 horas), mais os antipiréticos (de 4 em 4) — acabando, invariavelmente por passar o dia a correr para tentar compensar as tomas perdidas, esquecidas ou (quase) intencionalmente falhadas por me ter deixado dormir durante a noite— esta nova modalidade aparece como uma significativa evolução civilizacional.
Evolução esta que seria, muito pertinentemente, extensiva às relações humanas. Ao longo da nossa jornada enquanto obras do Criador cruzamo-nos com todo o tipo de pessoas. Muitas delas não tornamos a ver por mera e normal decorrência das circunstâncias, outras voltam a cruzar-se no nosso caminho sem que isso dependa da nossa vontade, e, nos piores casos, sem que o possamos evitar.
Alguns seres humanos com quem me cruzei são seres humanos de toma única: aparecem por uma qualquer razão, fazem sentido naquele momento, têm efeitos na nossa vida, mas não há qualquer razão para a constância, a permanência ou reiteração da sua presença. Trazem demasiados efeitos secundários e a insistência no consumo desrespeitando as contra-indicações poderá acarretar doenças de origem medicamentosa. Humanidade de toma única por oposição àqueles cuja eficácia depende, como numa qualquer pílula anticoncepcional, da disciplinada noção de que precisamos deles todos os dias.

Antes da guerra contamos as armas e, depois dela, os corpos. Nas relações procedemos, primeiro, à contagem dos corpos e, no fim de cada uma, à contagem das armas.